domingo, 27 de setembro de 2009

Corrida contra o tempo

A reportagem abaixo foi publicada hoje no GLOBO-Niterói. Uma das mais trabalhosas que eu já fiz. Um desafio porque eu não entendo nada de direito, de justiça, de processos... Na verdade, eu tive que correr contra o tempo para entender o mínimo possível sobre o assunto e lembrar aos juízes de que eles também devem correr contra o tempo. No fim das contas, deu tudo certo. Missão cumprida...


Liga da Justiça

Cada um dos 24 juízes da cidade terá que encerrar 958 ações até dezembro

Por Cássio Bruno

O Judiciário de Niterói corre contra o tempo. Para cumprir uma série de determinações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) — a principal delas identificar e julgar todos os processos ajuizados até 2005 —, 24 juízes da comarca da cidade serão de concluir, até dezembro, 22.993 ações pendentes na esfera estadual. Ou seja: cada um dos magistrados vai precisar analisar e encerrar uma média de 958 casos em pouco mais de três meses. Nos últimos quatro anos, o sistema, que está sobrecarregado, recebeu 553.367 processos, totalizando 576.226 em tramitação nas varas cível, de família e criminal, além dos juizados especiais (pequenas causas) cível, criminal e da infância, juventude e idoso.

A missão não será tarefa fácil. O objetivo do CNJ é desafogar os armários do Judiciário e acabar com a morosidade. Apenas sete dos 91 tribunais do país cumpriram antecipadamente a meta. A exigência vale para os tribunais de Justiça, Militar, Eleitoral, do Trabalho e as cortes superiores. O órgão, inclusive, inaugurou mês passado o processômetro, um placar que computa o andamento do cumprimento das metas de casos julgados e arquivados em todo o país. É possível conferir a evolução dos julgamentos pela internet no site .

Alexandre Scisinio, diretor do Fórum de Niterói e titular da 9 Vara Cível, iniciou uma operação que ele próprio classifica como Força Total. Ele e os colegas de toga estão sendo obrigados a fazer hora extra e levar processos para serem estudados, analisados e decididos em casa. O processômetro do CNJ revela, por exemplo, que, em janeiro de 2009, havia 55.375 processos até 2005 pendentes de julgamento. Em oito meses, a redução foi de 32.382. Segundo o juiz, ainda é preciso esforços.

— Eu ainda não pedi reforço, mas tem juiz que recorre aos juízes regionais. As maiores dificuldades são as ações referentes a inventários, usucapião, demarcações de terra e execuções de crédito — revela Scisinio, responsável por pelo menos quatro mil processos em tramitação.

De acordo com o Tribunal de Justiça (TJ) do Rio, entre 1 e 15 de setembro deste ano, 2.756 processos foram distribuídos nas varas e nos juizados especiais do município —uma média de 183,7 por dia. O índice é superior ao do mês anterior, que foi de 5.547 ações, sendo 178,9 diária.

Os assuntos campeões nos tribunais de Niterói em 2009, até agora, são indenizações por danos morais (3.769), seguido por telefonia (2.460), antecipação de tutela (1.177), contratos bancários (1.722), cartão de crédito (1.027), fornecimento de energia elétrica (1.012), lesão corporal leve (1.003), crime de trânsito (951) e violência doméstica (819).

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), subseção Niterói, Antonio José Barbosa da Silva, admite que o sistema está sobrecarregado:

— É um sufoco danado para os processos chegarem ao final. Nada anda. Parece que os advogados são incompetentes, mas não são. Precisamos de mais juízes e funcionários. Os atuais não estão suportando a demanda e não dão conta do recado. onsequentemente, a Justiça fica lenta. O que a OAB pode fazer é pedir mais gente ao Tribunal de Justiça. Não temos a caneta, entende?

Silva diz que o atraso na tramitação das ações já começa no ajuntamento das petições. A demora segue no despacho, no agendamento das audiências e até nas perícias de cálculos. Ele chegou a reivindicar a criação de mais um Juizado Especial Cível:

— Só que dependemos do governador Sérgio Cabral autorizar a suplementação da verba. A OAB está cumprindo seu papel, que é de apertar por todos os lados.

Na Comarca de Niterói, funcionam dez varas cíveis, quatro criminais e quatro de família. Há ainda três juizados especiais cíveis, um criminal e um da infância, juventude e do idoso, além de outro relacionado à violência doméstica familiar contra a mulher. A estrutura, atualmente, está dividida em dois prédios: o novo edifício, na Avenida Ernani Amaral Peixoto, com 12 andares, e o da Rua Visconde de Sepetiba, de 10 andares, ambos no Centro.

Zveiter: estão exercendo mais a cidadania

O presidente do Tribunal de Justiça do Rio, desembargador Luiz Zveiter, atribui o crescimento do número de processos em Niterói ao fato de a população estar mais ciente de seus direitos como cidadão. Segundo ele, apesar das ações por danos morais estarem no topo da lista, as queixas que mais crescem são as relacionadas à defesa o consumidor, como reclamações contra os serviços de telefonia.

— As pessoas estão exercendo o princípio da cidadania. Há também muitos processos de execuções fiscais, o que atinge 40% dos casos. Isso é natural. É cobrança de IPTU e de outros tributos. Para cumprir a lei de responsabilidade fiscal, as prefeituras distribuem essas ações. Com isso, vai acumulando — justifica ele.

Zveiter acredita que, com a inauguração do novo Fórum, em abril deste ano, as dificuldades foram minimizadas:

— Melhorou o atendimento à população e a advogados, juízes e servidores.

Não é, no entanto, a opinião do eletrotécnico Evaldo Carvalho de Freitas, de 42 anos, morador de Tenente Jardim. Na quarta-feira passada, ele aguardava ansioso por sua audiência, após sete meses de espera. Ele processou a empresa que fornece energia na cidade depois de um temporal em janeiro. Ficou três dias em casa sem luz com a mulher acidentada:

— Além da demora, eu cheguei aqui e tinha outra audiência no mesmo horário e local que a minha. É incoerente. Fiquei confuso. Ninguém me dava informações. Ou alguém faltou ou não tem funcionário suficiente.

Em fevereiro, logo que assumiu o cargo, Zveiter cancelou a mudança dos cartórios para o novo prédio, que chegou a ser inaugurado em janeiro por seu antecessor, desembargador José Carlos Murta Ribeiro. À época, o atual presidente constatou que o local ainda não estava em condições de receber a estrutura do Judiciário.

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